SÃO PAULO – Como de praxe, a temporada de resultados das empresas do setor imobiliário levou analistas a reavaliarem suas previsões. Fora da rotina dos últimos anos, o cenário desafiador motivou incorporadoras e construtoras de imóveis a adotarem um tom conservador no exercício de 2009.
Segundo levantamento da InfoMoney, durante o primeiro trimestre as empresas do ramo listadas na BM&F Bovespa realizaram menos lançamentos e priorizaram as vendas de unidades em estoque. No total, os lançamentos somaram um VGV (Valor Geral de Vendas) de cerca de R$ 2,280 bilhões; as vendas contratadas, R$ 3,692 bilhões.
A fim de limitarem riscos e conservarem a exposição futura de caixa, oito das 20 incorporadoras de capital aberto optaram por não anunciar novos projetos. Mesmo quem lançou nos três primeiros meses do ano, também adotou a estratégia de consumir as unidades remanescentes de lançamentos anteriores. Na somatória dos números, o setor lucrou R$ 450 bilhões no período.
Ímpeto de baixa renda
O programa habitacional anunciado em março pelo Governo trouxe certo alento à demanda tanto da baixa renda quanto à média alta, através do subsídio ao financiamento. Porém, nem todas as empresas usufruem do mesmo nível de exposição a determinados públicos-alvos, o que exige flexibilidade da estrutura.
Além do objetivo de queimar o estoque para corrigir uma eventual quantidade inadequada para um cenário conservador, as incorporadoras estiveram atentas aos R$ 34 bilhões pretendidos pelo governo para investir no setor, com foco sobretudo na baixa renda. Um nicho de oportunidade para algumas.
Isso porque é preciso realizar diversas mudanças de estrutura para mudar habilmente a direção do barco. Aquelas com atuação na alta renda teoricamente possuem mais dificuldade em migrar para produtos do segmento econômico, cujas características se assemelham a um artigo industrializado, ao contrário da média e alta renda.
Diversificação de risco
Para Cássio Audi, CFO e diretor de RI da Rossi Residencial, eis seu diferencial: diversificação tanto no segmento de renda quando geograficamente. Até porque as classes de renda mais elevada também foram contempladas no pacote estatal, com a medida de aumentar de R$ 350 mil para R$ 500 mil o limite do valor do imóvel que pode ser financiado pelo SFH (Sistema Financeiro de Habitação).
"O plano já está surtindo efeito. Notamos melhoria em todos os segmentos que atuamos, principalmente no econômico. As vendas têm ido muito bem", explicou. Ano a ano, a empresa vinha buscando maior exposição nesse nicho. Em 2007, 13% dos lançamentos foram voltados a esse público; em 2008, esse número foi para 29%. E, neste ano, a meta é ter no mínimo 50%.
"As primeiras impressões são positivas com relação ao pacote habitacional. No primeiro trimestre, de tudo que foi lançado no segmento econômico, mais da metade foi vendido no próprio trimestre". Foram nove lançamentos, sendo sete focados nesta área.
E os outros segmentos? "Lançamos um empreendimento em Campinas para o segmento de média e média alta renda, com unidades em torno de R$ 400 mil a R$ 500 mil – se enquadrando no novo limite do SFH -, vendemos 100% em um final de semana", acrescenta Audi, mais otimista com 2009.
Estrutura flexível
Não é só do plano do Governo que surgem oportunidades. Com uma postura conservadora desde o ano passado, permeada pela tese de lançar produtos dentro do plano de negócios, ou seja, destinados à classe média, média alta e empreendimentos comerciais, que tivessem uma demanda superior a 50%, a EzTec, dona da maior margem líquida – relação entre lucro líquido e receita líquida – do setor, encontrou espaço para anunciar dois novos projetos em 2009.
Em março, a incorporadora lançou um empreendimento comercial na região do Ibirapuera, onde atingiu 80% de vendas no próprio mês do lançamento. E agora está realizando seu maior lançamento da história, outro produto comercial na região da Berrini, com cerca de R$ 240 milhões em VGV. "Lançar por lançar não era nosso objetivo. A empresa trabalhou com o objetivo de fazer o lançamento ser um sucesso de vendas", destaca Emílio Fugazza, diretor financeiro e de Relações com Investidores da incorporadora.
"São produtos bem localizados, que têm uma possibilidade de valorização muito interessante. Quem está comprando, está acreditando concretamente em uma recuperação da economia. E havia uma carência de volume de salas, então conseguimos aproveitar e vemos o resultado no volume de vendas atualmente", completa o executivo.
Segundo ele, a flexibilidade de estrutura da EzTec, que permite carregar menos estoque, com empreendimentos com boa velocidade de venda, só é possível graças ao modelo firmado em 2008, incluindo redução de despesas. "Isso é fruto de planejamento. Hoje quando estudamos o que lançar e o que não lançar, é que estamos com a estrutura mais leve que nos permite ter esse tipo de atitude".