Por Rafael Marko 09/09/2016 16:24:22
O estudo encomendado pelo Ministério da Fazenda sobre mudanças no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) causou preocupação ao Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP), por considerar nova finalidade na destinação dos seus recursos, hoje prioritariamente destinados ao financiamento à habitação. “O FGTS banca 90% dos recursos federais para Programa Minha Casa, Minha Vida. Se isto acabar, ficaremos sem condições de produzir habitação popular e emprego em larga escala, e o déficit habitacional voltará a se elevar”, alerta o vice-presidente de Habitação do sindicato, Ronaldo Cury.
O Ministério da Fazenda abriu licitação, em 25 de agosto, para a contratação do estudo “Diagnóstico e propostas para a reforma do FGTS”, visando a mudança da legislação do fundo, que passaria a ser responsável pelo seguro-desemprego e por assegurar aos trabalhadores do setor privado uma aposentadoria complementar no regime de capitalização. No Termo de Referência da licitação, não há menção sobre como ficariam os financiamentos do Fundo de Garantia à habitação, infraestrutura e saneamento. Em 8 de setembro, o presidente Michel Temer negou mudanças no FGTS, e o Ministério desmentiu que houvesse determinação neste sentido e informou que o estudo se destina a subsidiar debate técnico interno.
O vice-presidente do SindusCon-SP destaca que, em 15 anos, o FGTS praticamente aumentou em cerca de dez vezes seu potencial de beneficiados e empregos. “Em 2000, os investimentos do Fundo de Garantia beneficiavam 1,3 milhão de pessoas, gerando 275 mil empregos. Em 2015, os investimentos atingiram 10,3 milhões de pessoas, gerando cerca de 2,9 milhões de empregos”, enfatiza.
Cury argumenta que, das 1,35 milhão de famílias brasileiras que se formam anualmente, 96% não conseguiriam ter suas necessidades de acesso à casa própria atendidas se dependessem exclusivamente dos financiamentos de mercado. “Sem programas como o Minha Casa, Minha Vida, com a concessão de subsídios, teríamos uma imensa favelização no país. O MCMV adiciona até 86% de poder de compra para uma família de baixa renda.”
De acordo com o vice-presidente, nos últimos dez anos o FGTS vem aumentando gradativamente sua participação no financiamento imobiliário. Nos primeiros cinco meses de 2016, o Fundo de Garantia foi responsável por 86% (350 mil) das unidades habitacionais financiadas, e a Caderneta de Poupança, pelas 14% restantes (57 mil).
“Cabe lembrar que o trabalhador cotista do Fundo, ao contratar um financiamento para a casa própria dentro do Programa Minha Casa, Minha Vida, é duplamente beneficiado: ele ganha um desconto direto (subsídio) e também é contemplado com juros menores que os de mercado.”
Trabalhadores beneficiados
Cury considera fundamental a utilização dos recursos do Fundo para financiamento habitacional, infraestrutura e saneamento. “Aproximadamente 67% dos valores do FGTS destinados ao subsídio habitacional beneficiam os próprios cotistas do Fundo, com renda familiar de até R$ 2.750, com prioridade àqueles que têm renda de até R$ 1.500. Sem os descontos (subsídios), esses trabalhadores precisariam trabalhar cerca de 16 anos para conseguir ter acesso a um financiamento à aquisição da casa própria.”
“Vale destacar ainda que o FGTS passou a oferecer crédito a setores da população até então não atendidos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e que assim passaram a ter condições de contratar financiamentos, absolutamente necessários para acessar os programas sociais.”
Para o vice-presidente, na medida em que aumenta a demanda habitacional qualificada desse público de baixa renda graças aos descontos, estes estimulam o mercado e, assim, retroalimentam a capacidade de investimento do FGTS em habitação. “Cria-se um ciclo virtuoso entre concessão de benefícios e o aumento da demanda por financiamento”, assinala.
“Não procede outra alegação do Termo de Referência da licitação do estudo, de que a sistemática atual do FGTS, ao permitir saque dos recursos nas demissões sem justa causa, estimula rotatividade excessiva no mercado de trabalho, resultando em baixa produtividade e menor esforço do trabalhador para se recolocar. O aumento das demissões sem justa causa está diretamente ligado à crise econômica e deverá ser revertido com a gradual retomada dos investimentos.”
Segundo Cury, se o governo está preocupado com a falta de recursos públicos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para destinar ao seguro-desemprego, deveria requisitar de volta os recursos repassados por este fundo ao BNDES, e não retirá-los do FGTS.
Cury ainda lembra que eventual majoração dos juros nos financiamentos do FGTS impactará as contas públicas dos entes municipais e estaduais que contraem empréstimos junto ao Fundo, provocando desequilíbrio fiscal. “Já o setor da construção civil sofrerá efeitos imediatos pelo encarecimento da sua produção. Isto, aliado à ausência de oferta de recursos a preço adequado à população que mais necessita ter acesso à moradia digna, afastará ainda mais a inclusão social deste segmento.”
“Quanto à desejada elevação da remuneração dos depósitos no Fundo de Garantia, isto poderá gerar um descasamento entre contas de seu ativo e seu passivo, provocando desequilíbrio financeiro. O governo deveria estudar a proposta formulada pelo setor da construção, de destinar parte dos lucros das aplicações do FGTS aos seus cotistas, o que não prejudicaria seu equilíbrio econômico-financeiro e manteria o financiamento a juros baixos para a casa própria.”