A multinacional de serviços aeroportuários Swissport conseguiu no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo um importante precedente para as empresas que não conseguem cumprir as cotas destinadas aos deficientes. Os desembargadores da 11ª Turma entenderam que o trabalho realizado pela companhia em aeroportos, nos pátios de manobra de aeronaves, ofereceria risco aos deficientes. Portanto, só deve contratar trabalhadores para a área administrativa.
Pela Lei nº 8.213, de 1991, as empresas com mais de cem empregados são obrigadas a destinar de 2% a 5% de suas vagas para deficientes. No caso da Swissport, a cota é de 5% e, de acordo com a decisão, deve ser aplicada somente "sobre o número de empregados lotados nos escritórios exercendo funções administrativas". Nos aeroportos de São Paulo, Guarulhos e Campinas, a Swissport tem 36 empregados em escritórios e 2.187 exercendo funções operacionais nos pátios de manobra.
Para a desembargadora Odette Silveira Moraes, relatora do caso, o trabalho realizado nos pátios de manobra de aeronaves oferece risco até mesmo ao trabalhador que não seja portador de necessidades especiais. "Como a própria denominação sugere, se são portadores de necessidades especiais não estão aptos a desenvolver determinadas atividades que possam requerer maior agilidade física, percepção, reação etc", diz a relatora no acórdão. "A lei não poderia obrigar uma empresa a contratar um portador de necessidades especiais para trabalhar em atividades incompatíveis com as suas condições de saúde, colocando em risco a sua vida."
De acordo com a relatora, a Swissport não teria como providenciar as alterações necessárias na infraestrutura aeroportuária para o emprego de pessoas com deficiência em atividades operacionais. "Providenciar alterações físicas para propiciar o acesso dessas pessoas nos pátios caberia ao administrador aeroportuário local juntamente com a Infraero e Anac [Agência Nacional de Aviação Civil], que possuem, além de outras obrigações, o dever de cuidar da infraestrutura aeroportuária do país, adotando as medidas necessárias para o atendimento do interesse público", afirma.
Por meio de nota, a Procuradoria Regional da União da 3ª Região informou que vai analisar a possibilidade de interposição de recurso contra a decisão favorável à Swissport.
Decisões como a obtida pela Swissport ainda são raras no Judiciário. Na maioria dos casos, as empresas têm conseguido apenas combater ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) com o argumento de que tentaram de todas as maneiras cumprir as cotas estabelecidas pela Lei nº 8.213. Nos últimos quatro anos, o MPT de São Paulo (2ª Região), por exemplo, aplicou 114 autuações e ingressou com 27 processos.
"É um precedente importante que pode ser usado, principalmente, por empresas do setor aéreo", diz o advogado Marcello Della Mônica Silva, do Demarest Advogados, que representa a Swissport no processo. "A jurisprudência precisa suprir lacunas da lei envolvendo questões complexas, como a incompatibilidade por riscos e a necessidade de incentivos à instituição de programas de capacitação profissional."
Nem mesmo a função de motorista de transporte de cargas é retirada do cálculo das cotas para deficientes. A Gafor Logística não conseguiu na 12ª Turma do TRT de São Paulo decisão nesse sentido e vai recorrer. "Para essa função é preciso ter carteira de habilitação com a categoria D ou E. Não há como contratar deficiente nessa situação até mesmo porque Resolução nº 80, do Conselho Nacional de Trânsito, determina que ao condutor de veículo adaptado é vedada a atividade remunerada", afirma a advogada Marcia Sanz Burmann, do Autuori Burmann Sociedade de Advogados, que representa a Gafor.
Em voto divergente, o desembargador Marcelo Freire Gonçalves, da 12ª Turma, reconheceu o problema. "Considerando-se que se trata de uma profissão peculiar, em relação à qual é exigida habilitação profissional específica e que um dos requisitos necessários para essa habilitação é a aptidão física e mental, afronta o princípio da razoabilidade exigir-se a contratação de motoristas deficientes físicos apenas para preencher a cota legal", diz o magistrado.
Para a advogada Cláudia Brum Mothé, sócia do Siqueira Castro Advogados, há ainda uma resistência na Justiça para a exclusão de atividades de risco do cálculo das cotas para deficientes. "Não é razoável. Esse entendimento majoritário está até contra a inclusão", afirma.
Fonte: Valor Econômico – Legislação & Tributos